A Comissão de Direitos Humanos (CDH) debateu nesta quinta-feira (23) o fortalecimento de políticas públicas para a proteção de crianças e adolescentes indígenas. Participantes da audiência pública defenderam, entre outras medidas, a ampliação do acesso à saúde, o combate à violência, o apoio para gestantes, a garantia de segurança alimentar e a preservação dos territórios. O debate foi sugerido pela senadora Damares Alves (Republicanos-DF).
— Todas as vezes que nesta Casa e na outra Casa [Câmara dos Deputados] falam de indígenas, a gente vai muito para o coletivo, o direito dos povos indígenas. Dificilmente a gente vê o recorte da criança indígena e a gente quer fazer esse recorte, a gente quer dar nome a essas crianças — afirmou Damares.
A senadora defendeu mais espaço no Orçamento da União para ações e programas em prol de crianças indígenas. Damares também sugeriu instituir em lei um programa nacional de proteção para esse grupo.
Em relação às leis de proteção, a senadora Margareth Buzetti (PSD-MT) declarou que as garantias da legislação atual ainda não são cumpridas nos territórios indígenas, como a Lei Maria da Penha (Lei 11.340, de 2006). Ela ressaltou que as leis aprovadas “têm que ser para todos”, mas isso ainda não é uma realidade.
A secretária-adjunta do Conselho Missionário Indigenista (CIMI), Ivanilda Torres dos Santos, mencionou na audiência dados das populações indígenas no Brasil registrados no Censo de 2022. O levantamento nacional mostrou que o país tem 1,69 milhão de pessoas indígenas, das quais mais da metade tem menos de 30 anos. Crianças e adolescentes na faixa de idade entre zero e 14 anos representam 29,95% da população indígena, seguida da faixa entre 15 e 29 anos, com 26,15%.
Bruno Kanela, diretor de Promoção da Política Indígena do Ministério dos Povos Indígenas, afirmou que os desafios para o atendimento à população indígena no Brasil “são enormes” e incluem também os emigrantes e refugiados. Sobre a situação de calamidade pública no Rio Grande do Sul, ele ressaltou que a pasta acompanha com servidores in loco a situação das comunidades atingidas nas enchentes.
No debate, o indígena ianomâmi Renato Sanumá falou sobre as dificuldades de combater o abandono e o abuso sexual infantil, além dos desafios de tratamento de crianças com deficiências e problemas neurológicos nas aldeias. Segundo ele, não há como proteger efetivamente as crianças sem medidas de apoio. Ele participou do debate por videoconferência, em sua língua nativa — traduzida durante a audiência.
Representante da Secretaria de Saúde Indígena do Ministério da Saúde, Vanessa Quaresma afirmou que a meta do governo federal é reduzir em 30% a mortalidade infantil até 2027, conforme a Agenda Transversal dos Povos Indígenas do Plano Plurianual (Lei 14.802, de 2024). As ações também têm como foco a saúde das mulheres indígenas gestantes.
— Nosso grande desafio é deixar de perder crianças nessa faixa etária menor de cinco anos. Nós não temos perdas acentuadas no período de até um ano, mas sim de um a quatro anos, a [faixa] menor de cinco anos. O maior desafio também é fazer com que seja cada vez menos por conta de mortes evitáveis de doenças prevalentes da infância — destacou.
Ela ressaltou que as dificuldades geográficas são uma das barreiras para acessibilidade dos serviços de saúde nos territórios indígenas. Integrante da etnia curuaia, Vanessa afirmou que uma das estratégias trabalhadas pela secretaria envolve integrar práticas de cuidados da medicina ocidental com as práticas da medicina indígena. Para isso, ressaltou ser preciso qualificar a força de trabalho, em especial em relação às questões interculturais.
Indígena da etnia terena, Henrique Dias afirmou no debate ser necessário dar maior visibilidade para a causa e para o cuidado das crianças, em especial nas áreas de fronteira. Para ele, o atendimento a essas populações deve considerar as características de cada grupo.
— Não podemos colocar todo indígena dentro do mesmo pacote. [Precisamos] entender que eles são diferentes. Nós somos diferentes. Embora sendo indígenas, temos peculiaridades culturais e nossas formas de ver — declarou.
Maria Aureni Gonzaga da Silva, indígena fulni-ô, defendeu que o combate à vulnerabilidade das crianças e jovens, passa pela garantia de segurança alimentar e pela proteção das mulheres. Ex-servidora da Fundação Nacional dos Povos Indígenas (Funai), ela afirmou que as medidas devem extrapolar o órgão e o Ministério dos Povos Indígenas para ser uma prioridade de demais pastas e entidades da administração pública.
Na audiência, Paulo Thadeu, do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda), declarou que o combate à situação de vulnerabilidade está relacionado à demarcação de terras, que são o “espaço ancestral dos povos originários”.
— A luta da terra também é uma questão de vulnerabilidade. A gente combater a vulnerabilidade é demarcar as terras indígenas — disse.
Thadeu criticou o aumento do garimpo ilegal em áreas de reservas indígenas. Para ele, negar o impacto das mudanças climáticas como resultado da exploração dos recursos naturais também contribui para a situação de vulnerabilidade dos povos indígenas.
Da etnia macuxi, o conselheiro do Conanda destacou ainda a importância do incentivo à participação de indígenas em conselhos tutelares. Outra forma de atuação em prol dos grupos indígenas, de acordo com ele, é ampliar a acessibilidade à documentos traduzidos, como leis e o próprio Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069, de 1990).
Fonte: Agência Senado
Senado Federal Anexo 2 Ala Teotônio Vilela Gabinete 04
SQN Qd 2, Bl J, 10º andar - Ed. Eng. Paulo Mauricio - Asa Norte